Dá por si perdida no olhar esfíngico, numa tentativa vã de lhe desvendar o enigma de tons terra. Há muito que aquelas janelas, que deveriam revelar o que de mais íntimo lhe vai na alma, se lhe afiguram fechadas, mesmo quando abertas de par em par, nos raros momentos em que a encara de frente, sem nunca se demorar, nada desvendando, nada deixando antever para lá daquela permanente névoa cerrada, na qual esquece o norte e se desorienta.
Isolado numa fortaleza de silêncios e aparente quietude, escuda-se do mundo, estratega rematado da sua própria defesa, ocultando a sua essência do desvelo dela. Domina os instintos com vontade férrea, não lhes permitindo qualquer passo em falso, qual senhor da guerra, ciente do poder da disciplina auto imposta.
Mestre na arte da ponderação, todo ele é contenção e racionalidade pura, no modo frio como analisa cada detalhe de tudo, como um jogador de xadrez, certificando-se das consequências de mexer um dos seus peões.
Apesar disso, há nele ternura, visível apenas a olhos atentos, pequenos lampejos de emoção e sentimentalismo que procura ocultar, vestígios de uma mágoa qualquer que carrega no peito, como lembrete, para nunca mais se deixar esmagar pela dor.
Compreender-lhe os intrincados mistérios, ler-lhe a alma, sabê-lo de cor, nada mais é que uma utopia, uma busca frustrada a cada nova tentativa, como caçar quimeras em sonhos...
Desperta da contemplação, quando acidentalmente ele lhe toca, com os longos dedos frios, e sente a pele queimar no exacto local onde a tocou, qual fogo fátuo, uma chama brilhante mas efémera.
E se ele é Quimera, ela é Fênix, deixando-se consumir nessa chama, até que dela apenas reste cinza, para renascer... E começar tudo de novo.
0 comentários:
Enviar um comentário